As qualidades do rebelde são multidimensionais. Primeiro, o rebelde não acredita em nada a não ser na própria experiência. A verdade dele é sua única verdade; nenhum profeta, nenhum messias, nenhum salvador, nenhuma santa escritura, nenhuma tradição antiga pode lhe dar a verdade. Eles podem falar sobre a verdade, podem fazer muito estardalhaço sobre a verdade, mas saber sobre a verdade não é conhecer a verdade. Saber sobre a verdade é o mesmo que tecer comentários em torno dela. Mas quem fica em torno nunca chega ao centro.
O rebelde não tem sistema de crença - crente ou ateu, hindu ou cristão. Ele é um investigador, um buscador. Mas é preciso entender algo bastante sutil: o rebelde não é um egoísta. O egoísta também não quer pertencer a nenhuma igreja, a nenhuma ideologia, a nenhum sistema de crença, mas a razão para ele não querer pertencer é completamente diferente da razão do rebelde. O egoísta não quer pertencer porque pensa demais em si mesmo. Ele é egocêntrico; só consegue ficar sozinho.
O rebelde não é egoísta, é totalmente inocente. A sua descrença não é uma atitude arrogante, mas uma abordagem humilde. Ele está simplesmente dizendo, “A menos que eu encontre a minha própria verdade, todas as verdades que emprestei dos outros são como um fardo para mim, elas não vão me libertar. Posso me tornar uma pessoa instruída, mas não conhecerei nada com o meu próprio ser. Não serei testemunha de nenhuma experiência”.
O rebelde não pertence a nenhuma igreja, a nenhuma organização, porque não quer ser apenas um imitador. Ele quer permanecer puro e imaculado para que possa buscar sem nenhum preconceito, de modo que possa permanecer aberto e sem nenhuma ideia preconcebida. Mas toda a abordagem é de uma pessoa humilde.
Um rebelde respeita sua própria independência e também respeita a independência de todas as outras pessoas. Ele respeita a sua própria divindade e respeita a divindade de todo o universo. Todo o universo é seu templo - é por isso que ele abandonou os pequenos templos feitos pelo homem. Todo o universo são suas sagradas escrituras - é por isso que ele abandonou todas as sagradas estruturas escritas pelo homem. Mas não é por arrogância, é para empreender uma humilde busca. O rebelde é tão inocente quanto uma criança.
A segunda dimensão será não viver no passado, que não existe mais, e não viver no futuro, que não existe ainda, mas viver no presente com a máxima consciência e espírito alerta que se possa conseguir. Em outras palavras, viver consciente no momento. Normalmente vivemos como sonâmbulos.
O rebelde tenta viver uma vida de consciência. A consciência é sua religião, a consciência é sua filosofia, a consciência é seu modo de vida.
A terceira dimensão é que o rebelde não está interessado em dominar os outros. Ele não tem avidez pelo poder, porque essa é a coisa mais feia do mundo. A avidez por poder destruiu a humanidade e não permite que ela seja mais criativa, que seja mais bela, que seja mais saudável, que seja mais inteira. E é essa avidez pelo poder que acaba levando aos conflitos, às competições, à inveja e finalmente às guerras.
A avidez por poder é a base de todas as guerras. Se você observar a história humana... toda a história humana não passa de uma história de guerras, do ser humano matando o ser humano. As razões mudaram, mas a mortandade continua. Parece que as razões são apenas desculpas. O fato real é que o ser humano gosta de matar.
Numa fábula de Esopo - e essas são as melhores fábulas do mundo, muito simples e cheias de significado -, uma ovelhinha está bebendo água de um riacho das montanhas, com água limpa e cristalina. Um leão enorme se aproxima e, naturalmente, se interessa pela ovelha - é hora do café da manhã. Mas ele tem que encontrar uma desculpa para o seu comportamento, então diz à ovelha, “Você está sujando o riacho. Não entende que eu sou o rei da selva?”
A pobre ovelhinha diz, “Mas Sua Alteza, estou bebendo água num trecho mais abaixo do rio, por isso, mesmo que eu suje a água, ela está correndo rio abaixo - não na sua direção. O senhor está tornando- a suja e eu estou bebendo essa água. Por isso sua lógica está errada”.
O leão viu que a ovelha tinha razão e ficou com muita raiva. Disse, “Você não tem respeito pelos mais velhos. Está discutindo comigo”.
A pobre ovelha rebateu, “Não estou discutindo, estou simplesmente constatando um fato. O senhor pode ver para onde a água está correndo”.
O leão se calou por um momento e então disse, “Agora eu me lembro. Você pertence a uma família muito pouco instruída e mal educada. O seu pai me insultou ontem”.
A pobre ovelha disse, “O senhor deve estar falando de outra pessoa, porque o meu pai morreu há três meses e o senhor deve saber que ele está na sua barriga. Ele não está mais vivo porque o senhor o almoçou. Como ele pode tê-lo desrespeitado? Ele está morto!”
Aquilo foi demais. O leão pulou sobre a ovelha e agarrou-a, dizendo, “Você não tem modos, não conhece as regras de etiqueta, não sabe se comportar”.
A ovelha disse, “O fato é que é hora do almoço. Simplesmente me devore, não precisa inventar mais desculpas”.
Uma fábula tão simples! Esopo fez milagres. Ele disse muita coisa sobre o ser humano.
Um rebelde vive simplesmente no momento, com percepção, sem nenhum desejo de dominar. Ele não tem nenhuma ânsia de poder. É um cientista da alma - essa é a quarta dimensão. Assim como a ciência usa a dúvida, o ceticismo, a investigação, ele usa os mesmos métodos para a busca interior. A ciência os usa para a realidade objetiva, ele os usa para sua própria subjetividade. Mas ele não condena a dúvida, não condena o ceticismo, não condena a desobediência, não condena uma abordagem descrente da realidade. Ele mergulha dentro do seu próprio ser com uma mente científica.
A religião do rebelde não é supersticiosa, é científica. Sua religião não é a busca de Deus, porque começar com Deus significa que você já aceitou a crença e, se aceitou a crença, a sua busca está contaminada desde o princípio.
O rebelde penetra no seu mundo interior de olhos abertos, sem nenhuma ideia do que está procurando. Ele continua polindo sua inteligência. Continua tornando seu silêncio mais profundo, sua meditação mais profunda, para que o que quer que esteja oculto dentro dele venha à superfície; mas ele não tem ideias preconcebidas sobre o que está procurando.
Ele é basicamente um agnóstico. Essa palavra tem que ser lembrada, pois ela descreve uma das qualidades mais básicas. Existem crentes que acreditam em Deus, existem ateus que não acreditam em Deus e existem agnósticos que simplesmente dizem, “Não sabemos ainda. Vamos buscar, então vamos ver. Não podemos dizer nada antes de termos procurado em todos os recônditos do nosso ser”. O rebelde começa com “eu não sei”. É por isso que eu digo que ele é como uma criança pequena, inocente.
Dois garotinhos discutiam sobre a possibilidade de fugir de casa. “Mas se os nossos pais nos pegarem, vão bater em nós”, disse um deles.
“Então batemos neles também”, disse o outro.
“Mas não podemos fazer isso! A Bíblia diz que temos que honrar pai e mãe.”
“Tudo bem, então eu bato no seu pai e você bate no meu.”
Uma solução simples e inocente, sem nenhuma dificuldade!
O rebelde vive uma inocência infantil, e a inocência é o mais misterioso dos fenômenos. Ela abre as portas de todos os segredos da vida.
Só uma pessoa rebelde é realmente revolucionária e é verdadeiramente religiosa. Ela não cria uma organização, não cria um séquito, ela não cria igrejas.
Mas é possível que rebeldes possam ser companheiros de viagem; possam apreciar a companhia uns dos outros, possam gostar de dançar juntos, de cantar juntos, de chorar juntos, para sentir a imensidão da existência e a eternidade da vida juntos.
Eles podem se fundir num tipo de comunhão sem ter que renunciar à própria individualidade; pelo contrário, a comunhão de rebeldes fortalece a individualidade de todos, nutre a individualidade de todos, dá dignidade e respeito à individualidade de todos.
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